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Foto do escritorChristian Lo Iacono

Oração – Parte II

— E, quando orarem, não sejam como os hipócritas, que gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos pelos outros. Em verdade lhes digo que eles já receberam a sua recompensa. 6 Mas, ao orar, entre no seu quarto e, fechada a porta, ore ao seu Pai, que está em secreto. E o seu Pai, que vê em secreto, lhe dará a recompensa. 7 E, orando, não usem vãs repetições, como os gentios; porque eles pensam que por muito falar serão ouvidos. 8 Não sejam, portanto, como eles; porque o Pai de vocês sabe o que vocês precisam, antes mesmo de lhe pedirem. 9 — Portanto, orem assim: “Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome; 10 venha o teu Reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu; 11 o pão nosso de cada dia nos dá hoje; 12 e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós também perdoamos aos nossos devedores; 13 e não nos deixes cair em tentação; mas livra-nos do mal [pois teu é o Reino, o poder e a glória para sempre. Amém]!” 14 — Porque, se perdoarem aos outros as ofensas deles, também o Pai de vocês, que está no céu, perdoará vocês; 15 se, porém, não perdoarem aos outros as ofensas deles, também o Pai de vocês não perdoará as ofensas de vocês.

No sermão passado vimos a importância de se orar a sós, de se falar com Deus reservadamente, porque o Pai, que vê em secreto, certamente nos abençoará. Também mencionamos que o Pai Nosso é uma oração que tem seis petições: as três primeiras, que dão o tom de toda a Oração, dizem respeito a Deus – seu nome, seu reino e sua vontade; e as outras três têm a ver com o ser humano – nosso alimento diário, nossos pecados e nossas tentações. O Pai Nosso também me ensina que, como um seguidor de Cristo entre muitos, devo me dirigir a nosso Pai, peticionando o nosso pão de cada dia, pedindo perdão pelos nossos pecados e livramento de nossas tentações. Trata-se de uma visão coletiva da fé cristã, não individualista. Além disso, quando Jesus ensinou seus discípulos a orarem “Pai nosso, que estás nos céus”, Ele estava falando com homens que já estavam convencidos da grandiosidade da transcendência de Deus e que, então, sentiram-se privilegiados de poder chamar a Deus de Pai. Hoje, parece que a compreensão da transcendência de Deus está um pouco banalizada.


“Santificado seja o teu nome”. A primeira petição diz respeito a esse Pai excelso. Entre os semitas, o nome de uma pessoa é intimamente ligado ao que ela é. Portanto, ao revelar no AT que tem esse ou aquele nome, Deus está usando seu nome para se revelar como Ele é. Os nomes são explicativos, reveladores. Entre os vários nomes de Deus estão: Altíssimo, o Todo-Poderoso, Eu Sou, Eu Sou Aquele que te ajuda, Eu Sou Aquele que é a tua justiça etc. E, quando pensamos no caráter de Deus oculto por trás desses nomes, devemos orar: “Santificado seja o teu nome”. “Santificar” é tornar santo ou considerar santo. O verbo é usado em 1Pedro 3.15: “Santifiquem a Cristo, como Senhor, no seu coração”. Temos de reverenciar, honrar, considerar santo e reconhecer Cristo como o Senhor santo. Semelhantemente, devemos reverenciar, honrar, considerar santo e reconhecer o nome de Deus e, portanto, o próprio Deus.


Apesar de ser uma súplica para que o nome de Deus seja santificado e, portanto, supostamente um pedido para que Deus santifique seu próprio nome, trata-se, contudo, de uma oração que, quando atendida, significa que nós vamos santificar o nome de Deus. Ou seja, os seguidores de Cristo estão pedindo a seu Pai celestial que aja de tal maneira que eles e um número cada vez maior de pessoas reverenciem a Deus, glorifiquem o seu nome e o reconheçam. Muitos usam “Deus” e “Jesus” como interjeições de dor, medo ou espanto, ou quando estão irritados ou aborrecidos, ou até mesmo em piadas. Porém, à medida que essa oração é atendida, eles não só deixarão esse hábito, mas também passarão a considerar o nome de Deus tão santo que simplesmente pensar nele será suficiente para incitar espírito de reverência e temos santo.


De certa forma, orar “santificado seja o teu nome” é orar: “Faz-me santo. Opera em mim e em outras pessoas para que reconheçamos sempre tua santidade gloriosa e insuperável”. Mas a petição como Jesus a ensina se estrutura não tanto em relação ao que tem de acontecer conosco para a oração ser atendida, mas, sim, em relação ao próprio alvo. O alvo mais elevado não é nós sermos santificados, mas, sim, o nome de Deus ser santificado. Isso tira o ser humano do centro da cena e dá esse lugar somente a Deus. O ser humano – mesmo o transformado – não é o centro do universo. O principal propósito do ser humano é de fato glorificar a Deus e desfrutar eternamente de sua presença. Essa breve petição tem sozinha tanto conteúdo para meditação, tantas implicações sobre como devemos pensar sobre Deus, que é suficiente para nos pôr a todos de joelhos.


“Venha o teu reino” (v.10). Isso não pode ser um pedido para que a soberania universal de Deus seja exercida, pois ela está sempre em vigor. Refere-se ao reino salvífico de Deus, que, em um aspecto já está presente, mas em outro ainda aguarda sua plena consumação no futuro. Orar “venha o teu reino” é orar para que o reino salvífico de Deus se expanda mesmo agora e, mais ainda, que Deus traga o seu reino consumado. O reino de Deus virá em sua plenitude porque será inaugurado pela volta de Jesus. Se os primeiros cristãos desejavam ardentemente que o poder e a autoridade de Jesus se manifestassem por meio deles no seu constante testemunho (At 4.28-29), estavam mais ainda ansiosos pela volta de Jesus e oravam: “Maranata” – “Vem, Senhor!” (1Co 16.22). Eles aguardavam com expectativa “novos céus e nova terra, onde habita justiça” (2Pe 3.13). O último livro da Bíblia conclui com a oração: “Vem, Senhor Jesus!” (Ap 22.20).


“Venha o teu reino”: os cristãos não devem fazer esse pedido de maneira frívola ou descuidada. Ao longo dos séculos, os seguidores de Jesus debaixo de perseguição brutal têm feito essa oração com consciência e fervor. Mas tenho a impressão de que as cadeiras confortáveis de nossas igrejas zombam de nossa sinceridade quando repetimos essa frase hoje. Não temos nenhuma objeção à volta do Senhor, acredito, contanto que Ele espere um pouco e nos deixe primeiro terminar a faculdade, ou nos deixe experimentar a vida de casado, ou nos dê tempo para termos êxito nos negócios ou na vida profissional, ou nos dê a alegria de ver nossos netos nascerem. Será mesmo que desejamos ardentemente que o reino venha em toda a sua insuperável justiça? Ou será que preferimos caminhar sobre um atoleiro de falsidade e injustiça?


A terceira petição, “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”, pode bem ser um pedido para que o reino de Deus venha em sua plenitude, pois a característica mais maravilhosa dessa vinda será o cumprimento perfeito da vontade do Pai, sem demora, rebeldia, prevaricação, agentes do mal nem aquelas misteriosas mudanças de acontecimentos pelas quais Deus opera hoje, mesmo usando a maldade dos homens (Gn 50.20; Is 10.5-19). Mas é possível uma aplicação mais geral dessa petição. A vontade ética de Deus (seu desejo de ver a justiça praticada) só será completamente cumprida no reino consumado. Contudo, os que agora pertencem a esse reino, como ele se manifesta atualmente entre nós, já têm a obrigação especial de cumprir essa vontade. A maior parte do texto de Mateus 5 diz exatamente isto: para entrar no reino do céu é obrigatório ter justiça incomparável (v. 20). No reino consumado, é claro que não será

necessário estabelecer regras acerca do divórcio, dar a outra face, ódio, cobiça, hipocrisia e outras transgressões. No momento, entretanto, um aspecto essencial de nossa busca ética do reino é que essa ética deve ser demonstrada em um mundo onde o mal ainda predomina. Na consumação, não serei mais tentado a revidar se alguém me der um tapa no rosto, porque não haverá mais tapas no rosto; não serei mais tentado a odiar os meus inimigos, porque não mais terei inimigos. Logo, embora as exigências absolutas de justiça não sejam diminuídas nem atenuadas pela desculpa da pressão da presente era maligna, elas são concebidas levando em conta a oposição ao mal desta era. É assim que elas apontam para a perfeição futura do reino consumado, quando a vontade de Deus será cumprida ampla, aberta e livremente, sem exceções nem restrições e sem a dolorosa necessidade de defini-la (a vontade de Deus) com referência à oposição ao mal.


Ou seja, quando Jesus diz “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”, imagino que Ele tenha escolhido palavras que levam em conta alguns contrastes. Ele pode estar nos ensinando a orar para que 1) os desejos de Deus em relação à justiça sejam plenamente cumpridos agora na terra, assim como são cumpridos agora no céu; 2) os desejos de Deus em relação à justiça sejam por fim cumpridos tão plenamente na terra assim como são cumpridos agora no céu – isto é, essa frase é análoga a “venha o teu reino”; 3) os desejos de Deus em relação à justiça sejam finalmente cumpridos na terra da mesma maneira que são cumpridos no éu – isto é, sem referência à oposição do mal, mas pura e absolutamente.


Precisamos entender que, se estamos orando para que a vontade de Deus seja feita na terra, estamos assumindo duas importantes responsabilidades. Em primeiro lugar, estamos nos comprometendo a aprender tudo o que pudermos sobre a vontade dele. Isso significa estudar as Escrituras com constância e humildade. Uma coisa que causa pesar é ouvir cristãos insistirem na autoridade e infalibilidade das Escrituras quando eles mesmos não se empenham em estudar as Escrituras com zelo, e também não se empenham em praticá-las. Ora, quais são os temas de Zacarias e Gálatas? O que aprendemos acerca da vontade de Deus nos textos de Êxodo e Efésios? Em que o retrato de Jesus traçado por Mateus e o traçado por João diferem, e em que se complementam? Nessa semana que passou, quando estudamos sobre a vontade de Deus, o que aprendemos que provocou aperfeiçoamento e melhora em nossa vida? Isso nos leva à segunda responsabilidade. Se o anseio profundo do meu coração é que a vontade de Deus seja feita, então, ao fazer essa oração, também estou prometendo que, com a ajuda e a graça de Deus, vou fazer a vontade dele até onde eu a conheço!


A urgência de se praticar a vontade de Deus pode ser vista na parábola do rico insensato (Lc 12.16-20). Certo rico pensa que, por causa do seu muito trabalho, garantiu sua vida, e agora pode descansar e viver em pleno deleite. Mas como diz Jesus em outros trechos, “quem quiser preservar (garantir) sua vida, irá perdê-la” (Mc 8.35). Assim, o homem é um insensato no sentido bíblico, pois ele procura viver sem levar Deus em conta. Contudo, a calamidade repentina está prestes a alcançá-lo: “Louco! Esta noite lhe pedirão a sua alma, e o que você tem preparado, para quem será?” (v. 20). Como bem observa Gordon Fee, “a lição da parábola não é a qualidade inesperada da morte. É a urgência da hora. O reino está próximo. A pessoa é insensata quando vive para suas posses, para sua própria segurança, quando o fim está bem às portas. Note como essa interpretação é apoiada pelo contexto. Certo homem quer que seu irmão compartilhe a herança com ele [Lc 12.13-15]. Jesus, no entanto, recusa-se a envolver-se como árbitro

entre eles. Seu argumento é que o desejo de possuir bens é irrelevante à luz do momento atual”.


É assim também que Fee entende “a mais difícil das parábolas: a do administrador infiel (Lc 16.1-8). [...] Ele deixou todas as contas dos devedores [do seu senhor] serem novamente ajustadas [a menor], provavelmente na esperança de garantir amizades lá fora. O impacto da parábola, e a parte com que a maioria de nós também tem dificuldade de lidar, é que os ouvintes originais esperam desaprovação. Em vez disso, essa negociata é louvada! [...] É bem provável que ele [Jesus] esteja desafiando seus ouvintes com a urgência da hora. Se ficam devidamente indignados com semelhante história, ainda mais devem eles aplicar as lições a si mesmos. Seus ouvintes estavam na mesma posição do administrador infiel que via a calamidade iminente, mas a crise que os ameaçava era incomparavelmente mais terrível. Aquele homem agiu (note que Jesus não desculpa sua ação); fez alguma coisa para solucionar a situação. Para você, também, a urgência da hora exige ação; tudo está em jogo” (Gordon Fee).


Essas são as 3 petições da oração-modelo do Senhor. Os principais interesses e prazeres do seguidor de Jesus são a glória de Deus, o reino de Deus e a vontade de Deus. Só depois disso o cristão pensa em suas necessidades pessoais e nas dou outros!

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