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Foto do escritorChristian Lo Iacono

OS DONS DO ESPÍRITO II| Série: O Espírito Santo na Igreja -Parte VIII

1 Irmãos, não quero que vocês estejam desinformados a respeito dos dons espirituais.2 Vocês sabem que, quando eram gentios, se deixavam conduzir aos ídolos mudos, conforme vocês eram guiados.3 Por isso, quero que entendam que ninguém que fala pelo Espírito de Deus afirma: "Anátema, Jesus!" Por outro lado, ninguém pode dizer: "Senhor Jesus!", senão pelo Espírito Santo.

4 Ora, os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo.5 E também há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo.6 E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos.7 A manifestação do Espírito é concedida a cada um visando um fim proveitoso.8 Porque a um é dada, mediante o Espírito, a palavra da sabedoria; a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra do conhecimento.9 A um é dada, no mesmo Espírito, a fé; a outro, no mesmo Espírito, dons de curar;10 a outro, operações de milagres; a outro, profecia; a outro, discernimento de espíritos. A um é dada a variedade de línguas e a outro, capacidade para interpretá-las.11 Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas essas coisas, distribuindo-as a cada um, individualmente, conforme ele quer.


28 A uns Deus estabeleceu na igreja, primeiramente, apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mestres; depois, operadores de milagres; depois, os que têm dons de curar, ou de ajudar, ou de administrar, ou de falar em variedade de línguas.29 Será que são todos apóstolos? Será que são todos profetas? Será que são todos mestres? São todos operadores de milagres?30 Todos têm dons de curar? Todos falam em línguas? Todos têm o dom de interpretar essas línguas?


1Coríntios 12.1-11, 28-30



Todos os dons espirituais são miraculosos?


Todos os dons espirituais são miraculosos? Alguns podem estar surpresos com a pergunta, porque nunca pensaram que todos os charismata implicassem em milagres. Todavia, a pergunta precisa ser feita, porque parece que algumas pessoas dão a impressão de que a palavra "carismático" é mais ou menos sinônimo de "miraculoso". A resposta à pergunta precisa começar com a repetição de alguns dons que, longe de serem miraculosos, parecem ser bem comuns, ou ordinários. Não há necessariamente nada de miraculoso nos dons de ensino e exortação, ou em dar dinheiro e exercer misericórdia.


Também não há razão óbvia, pelo menos a concluir pelas palavras, para se pensar que "palavra da sabedoria", "palavra do conhecimento" ou "fé" (1Co 12.8-9) sejam, ou incluam, “milagres”. Nada no texto ou no contexto sugere isso. A interpretação natural é que esses dons se referem a uma medida especial de sabedoria e conhecimento (somada ao dom de comunicá-los) e a um grau especial de fé, obviamente não para justificação ou santificação, mas para um tipo especial de ministério. Alguns exemplos do AT são Salomão, que recebeu o dom da sabedoria, e os heróis de Hebreus 11, que receberam o dom da fé.


No mesmo sentido, Paulo e Pedro chamam o "servir" de dom espiritual (Rm 12.7; 1Pe 4.11). O verbo diakoneo é comum e pode se referir a qualquer tipo de serviço, pastoral ou (o que é mais provável) prático. Ho diakonon é o garçom que serve à mesa (Lc 22.26s.), e a mesma palavra é usada para o trabalho doméstico de Marta (Lc 10.40). Depois, Paulo menciona em 1 Coríntios 12.28 dois charismata traduzidos por "ajudar" e "administrar" (antilempseis e kubernêseis). A primeira palavra aparece somente aqui no NT, mas é corretamente traduzida por "ajudas" ou "atos de ajuda". Parece ser outro termo geral como "serviço". Kuberneseis, por sua vez, significa "administração", e o Léxico de Arndt-Gingrich acrescenta que "o plural indica provas de capacidade para ocupar uma posição de liderança na igreja".


A palavra cognata kubernêtes é o "timoneiro", o "piloto" ou, mesmo, o "capitão" de um navio (At 27.11), vindo a ser aplicada figuradamente, no grego clássico, para pessoas em posições seculares de liderança como, por exemplo, o governador de uma cidade. Kuberneseis parece ser, então, o dom de guiar ou dirigir outros, talvez, incluindo a capacidade de distribuir responsabilidades para partes do programa da igreja, ou a liderança de presidir uma reunião e "pilotar" com sabedoria os procedimentos de uma diretoria.


O que dizer, então, dos dons miraculosos? "Operações de milagres" (1Co 12.10) e "operadores de milagres" (v. 28) já dizem pelo nome que envolvem milagres; o mesmo acontece provavelmente com "dons de curar”, “curas”, bem como "variedades de línguas" e "interpretação de línguas" (vv. 9-10, 28-29). Presumindo que todos esses são dons miraculosos, surge a pergunta: Será que eles ainda são concedidos nos dias de hoje? É estranho como as pessoas em geral têm rapidamente a resposta pronta, seja um simples "sim" ou "não", sem verificar primeiro se há uma doutrina bíblica de milagres, à luz da qual essa pergunta possa ser analisada e respondida. Talvez tanto o "sim" quanto o "não" sejam respostas incompletas.


Um "não" dogmático, talvez, acrescido de: "Milagres não acontecem mais hoje" ou, pior: "Milagres não podem acontecer", é uma posição impossível de ser mantida por um cristão. O Deus em que cremos é o criador livre e soberano do universo. Ele sustenta tudo pela palavra do seu poder. Toda a natureza lhe está subordinada. Ele não somente pode operar milagres, mas também tem feito milagres. Quem somos para restringir seu poder e dizer-lhe o que pode ou não fazer?


Todavia, a posição oposta também parece ser questionável. Em sua forma mais extrema, ela diz que quase tudo o que Deus faz é miraculoso. Entretanto, por definição, um milagre é um evento extraordinário, um desvio criativo da maneira normal e natural pela qual Deus age. Se milagres fossem coisas comuns, deixariam de sê-los. No entanto, alguns cristãos veem a atuação de Deus somente no que é milagroso. Eles fizeram dele um tipo de mágico.


Deus é “o Altíssimo”, que “tem domínio sobre os reinos do mundo” (Dn 4.32), que "considera as nações como um pingo que cai dum balde" e "carrega as ilhas como pó fino" (Is 40.15). "Deus é o juiz: a um ele humilha, a outro ele exalta" (Sl 75.7). Também é ele quem faz seu sol nascer e quem envia a chuva (Mt 5.45), quem mantém a regularidade das estações (Gn 8.22; At 14.17), quem comanda o ímpeto do mar (Sl 89.9), quem alimenta as aves e veste as flores (Mt 6.26, 30), e quem tem o fôlego do ser humano em sua mão (Dn 5.23).


A partir do momento em que percebermos o Deus vivo constantemente em ação, através dos processos da história e da natureza, começaremos a concluir, por exemplo, que toda cura é cura divina, seja com, ou sem, o uso de meios naturais, psicológicos ou cirúrgicos. Sem esses meios, a cura pode ser chamada, corretamente, de "cura miraculosa"; com o uso de recursos disponíveis ela pode ser chamada de "não-miraculosa", mas as duas possibilidades são, igualmente, "cura divina".


Uma forma menos extrema dessa segunda posição é a afirmação de que, apesar de que nem tudo o que Deus faz é miraculoso, ele quer que os milagres sejam elementos regulares de nossa vida e ministério nos dias de hoje, como acontecia com nosso Senhor e seus apóstolos. Mas isso também não pode ser sustentado por pessoas que tiram sua doutrina de milagres da Bíblia. As Escrituras contêm muitas histórias de milagres, mas elas não são somente um livro de milagres, assim como o Deus da Bíblia não é somente um Deus de milagres. Grandes porções da história bíblica não contêm um único registro de milagre. De João Batista, que Jesus chamou de o “maior” “entre os nascidos de mulher” (Mt 11.11), é dito especificamente que ele não fez nenhum milagre (Jo 10.41).


Na verdade, quando começamos a identificar onde os milagres estão na Bíblia, descobrimos que eles se agrupam como estrelas no céu. Existem quatro constelações principais. A primeira concentração de milagres é a época de Moisés (as pragas do Egito, a passagem pelo Mar Vermelho, o maná, a água etc). A próxima é a época de Elias, Eliseu e de outros profetas; a terceira é no ministério do próprio Senhor Jesus, e a quarta no dos seus apóstolos.


Acontece que essas são as quatro épocas principais em que houve revelação – a lei, os profetas, o Senhor Jesus e os apóstolos. E o principal propósito dos milagres era confirmar cada novo estágio da revelação. Por exemplo, o fato de que Moisés era um profeta especial ("com quem o Senhor tratava face a face") foi confirmado por seus milagres especiais ("Nunca mais se levantou em Israel um profeta como Moisés, [...] que fizesse todos os sinais e maravilhas, que, por ordem do Senhor, ele fez..." – Dt 34.10-11). De maneira semelhante, o ministério do Senhor Jesus foi "aprovado por Deus [...], com milagres, prodígios e sinais, os quais o próprio Deus realizou entre vocês por intermédio dele..." (At 2.22).


Assim, Deus também testificou da mensagem das testemunhas oculares apostólicas "por meio de sinais, prodígios, vários milagres e a distribuição do Espírito Santo, segundo a sua vontade" (Hb 2.4). Por essa razão é correto chamar o livro de Atos de "Atos dos Apóstolos", porque todos os milagres que Lucas registrou nesse livro foram feitos por apóstolos (veja At 2.43, 5.12); as duas únicas exceções são de dois homens que os apóstolos tinham comissionado pessoalmente, pela imposição de mãos (6.8 – Estêvão; 8.6-7 – Filipe). Da mesma forma, os sinais que Paulo fez foram chamados por ele de "credenciais de apóstolo" (2Co 12.12).


Então, qual deve ser nossa atitude diante de milagres que acontecem hoje? Não deve ser nem uma incredulidade ("não acontecem mais milagres"), nem uma credibilidade impensada ("Milagres estão acontecendo o tempo todo"), mas uma atitude de mente aberta, de averiguação. John Stott: "Eu não conto com milagres como algo comum nos dias de hoje, porque a revelação especial que eles estavam confirmando já está completa; mas, sem dúvida, Deus é soberano e livre, e é bem possível que haja situações especiais em que lhe apraz fazer milagres".


Será que todos os dons espirituais da Bíblia são dados hoje?


Já demos a entender que provavelmente as quatro listas da Bíblia sobre os dons não são completas, e que podem existir dons espirituais concedidos hoje que não aparecem em nenhuma dessas listas. Por outro lado, também verificaremos que nem todos os vinte ou mais dons que são relacionados nas Escrituras são concedidos necessariamente hoje. Devemos nos perguntar, por exemplo, se há "profetas" e "apóstolos" hoje na igreja. Para as pessoas que partem do pressuposto de que todos os charismata mencionados no Novo Testamento ainda são concedidos, a existência atual de “apóstolos e profetas” é ponto pacífico. Esses cristãos geralmente dizem que não há "nenhuma evidência bíblica" de que algum dom seria tirado. Será?


É provável que a palavra "apóstolo" seja usada com três sentidos diferentes no Novo Testamento. Somente em um único texto parece que ela é usada para todos os cristãos, onde Jesus diz que "o enviado (apostolos) não é maior do que aquele que o enviou" (Jo 13.16). No sentido geral de que todos nós somos enviados por Cristo ao mundo e compartilhamos da missão apostólica da igreja (Jo 17.18, 20.21), todos somos "apóstolos", em sentido amplo. Mas, já que isso se aplica a todos os cristãos, não é um charisma dado somente a alguns.


Em segundo lugar, a palavra é usada pelo menos duas vezes para "mensageiros (apostolos) das igrejas" (2Co 8.23; Fp 2.25); mensageiros enviados em missões especiais de uma igreja para outra. Nesse sentido, a palavra pode ser aplicada a missionários e outros cristãos enviados em missão especial. Porém, naturalmente não é esse o sentido do charisma "apóstolo", porque nas duas listas em que o dom de "apóstolo" ocorre esse dom encabeça a lista (1Co 12.28-29; Ef 4.11), e que na lista de Coríntios os primeiros dons estão em ordem de importância "primeiro, segundo, terceiro" – v. 28), e "apóstolos" vêm "primeiro".


O dom do apostolado, que recebe essa preferência, deve se referir, portanto, àquele grupo pequeno e especial de homens que foram "apóstolos de Cristo", e que incluía os doze (Lc 6.13), Paulo (p. ex., Gl 1.1), provavelmente Tiago, o irmão do Senhor (Gl 1.19), e possivelmente um ou dois outros. Eles detinham a condição especial de terem sido testemunhas oculares do Jesus histórico, especialmente depois da ressurreição (At 1.21-22; 1Co 9.1, 15.8-9), de terem sido indicados e autorizados pessoalmente por Cristo (Mc 3.14), e de terem sido inspirados especialmente pelo Espírito Santo para o seu ministério de ensino (p. ex., Jo 14.25-26, 16.12-15). Portanto, nesse sentido principal em que estão na lista, eles não têm sucessores, como se dá com "missionários" hoje, no sentido secundário do termo.


E o que dizer dos profetas? Sem dúvida, na história da igreja houve ocasiões em que se alega terem surgido profetas. Será que essas alegações têm precedentes? Isso depende em grande parte de nossa definição do que seja "profecia" e "profeta". O conceito bíblico, que remonta ao tempo do Antigo Testamento, é que um profeta era um instrumento da revelação divina, a quem vinha a palavra do Senhor e que, portanto, pronunciava as próprias palavras de Deus (p. ex., Êx 4.12, 7.1-2; Jr 1.4-9, 23.16, 18, 22, 28). Nesse sentido do termo, que é o significado bíblico essencial, creio que devemos dizer que não há mais profetas, porque a autorrevelação de Deus foi completada em Cristo e no testemunho apostólico de Cristo, e o cânon da Escritura foi encerrado há muito.


Além disso, "profetas" vêm logo depois dos apóstolos nas listas de Efésios e 1Coríntios mencionadas acima, sendo que "apóstolos e profetas" são, em diversos textos, encarados como fundamento (por causa do seu ensino) sobre o qual a igreja é edificada (Ef 2.20, 3.5). O conhecimento mais simples possível de construção arquitetônica é suficiente para nos dizer que, uma vez colocado o alicerce de um edifício e a estrutura superior sendo construída, o alicerce não pode ser colocado novamente. Paulo escreveu: “Segundo a graça de Deus que me foi dada, lancei o fundamento como sábio construtor, e outro edifica sobre ele. Porém cada um veja como edifica. Porque ninguém pode lançar outro fundamento, além do que foi posto, o qual é Jesus Cristo” (1Co 3.10-11).


Portanto, no sentido primordial de "profetas", como veículos de revelação direta e nova, parece que temos de dizer que esse charisma não é mais concedido. Será que existe alguém na igreja que pode se arriscar a dizer: "Veio a mim a palavra do Senhor, dizendo..." ou "Assim diz o Senhor"?


Entretanto, tem sido argumentado que "profeta" pode ser usado em um outro sentido, secundário. Algumas pessoas acham que hoje pode haver pessoas como o profeta Ágabo (At 11.28, 21.10-11), cuja função não é acrescentar algum elemento à revelação, mas predizer algum evento futuro. Isso é possível. Todavia, tanto a história da igreja quanto a experiência pessoal nos fazem ser cautelosos. John Stott reconhece que nada trouxe mais descrédito para a igreja do que o fato de que certas predições de "profetas" não se concretizaram. “As minhas próprias observações confirmam isso, porque eu mesmo ouvi muitas predições que não se cumpriram e levaram as pessoas envolvidas ou à desonestidade ou à desilusão.”


Outras pessoas sugerem que ministério protético é o que interpreta acontecimentos políticos ou comenta assuntos sociais (como os profetas do Antigo Testamento); porém é difícil isolar esse aspecto da sua obra e da sua inspiração divina. Ainda outros interpretam o dom da profecia como o dom da exposição da Escritura ou da pregação, ou de "edificar, exortar e consolar" (1Co 14.3). Nesse sentido, Abraão Kuyper escreveu: "Por profecia, Paulo entendeu pregação inspirada, em que o pregador se sente ungido e impulsionado pelo Espírito Santo".


Entretanto, essas interpretações talvez fiquem longe da elevada definição bíblica acerca da profecia. Na Escritura, um profeta não é, em primeiro lugar, uma pessoa que prediz o futuro, nem alguém que comenta o cenário político, nem um pregador avivado, nem mesmo alguém que traz uma palavra de ânimo; ele é a boca de Deus, o instrumento de uma revelação. Parece que nesse sentido Paulo identifica "apóstolos e profetas" como os mais importantes de todos os charismata (Ef 2.20, 3.5, 4.11; 1Co 12.28); e é nesse sentido que devemos dizer que eles não existem mais na igreja (sejam quais forem os significados e ministérios secundários dessa palavra). Hoje, Deus não ensina mais a igreja através de uma nova revelação, mas pela exposição da sua revelação que foi completada em Cristo e na Bíblia.


Assista o Sermão completo no Youtube:




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